terça-feira, 28 de fevereiro de 2023

Steven Soderbergh - “Ocean’s Eleven – Façam as Vossas Apostas” / “Ocean’s Eleven”


Steven Soderbergh
“Ocean’s Eleven – Façam as Vossas Apostas” / “Ocean’s Eleven”
(EUA – 2001) – (116 min./Cor)
George Clooney, Brad Pitt, Matt Damon, Julia Roberts, Andy Garcia Elliott Gould.

Para quem não sabe (e serão alguns) o original “Ocean’s Eleven” foi realizado em 1960 por Lewis Milestone, contando no elenco com o famoso “rat pack” ou seja Frank Sinatra, Dean Martin, Sammy Davis Jr., Peter Lawford e a Dama era a bela Angie Dickinson.


Vale a pena descobrirem e compararem com este belo “remake” de Steven Soderbergh.

Rui Luís Lima

Roman Polanski - “O Deus da Carnificina” / “Carnage”

Roman Polanski
“O Deus da Carnificina” / “Carnage”
(França, Alemanha, Polónia, Espanha – 2011) – (80 min./Cor)
Jodie Foster, Kate Winslet, John C. Reilly, Christoph Waltz.

Roman Polanski passou ao grande écran de uma das mais famosas peças de Yasmina Reza, com um saber e uma direcção de actores inesquecível e em “O Deus da Carnificina” / “Carnage” encontramos uma Jodie Foster como não víamos há muito, já Kate Winslet é soberba na figura da esposa desse homem que não larga o telemóvel e depois temos dois actores invulgarmente talentosos e se John C. Reilly sempre foi excelente nas personagens a que deu vida, já o austríaco Christoph Waltz, que muitos descobriram num filme de Tarantino, revela-se o actor perfeito para encarnar este Alan Cowan que, com a esposa, vai a casa dos pais do jovem que agrediu o seu filho no Brooklin Bridge Park, a fim de resolverem o incidente ocorrido entre as duas crianças que navegam nessa idade crítica da adolescência.


E aqui navegamos no universo do politicamente correcto que, ao longo do encontro, irá invadir territórios que nenhum dos casais estaria à espera, mas como todos sabemos palavra puxa palavra e uma palavra errada dita numa altura errada ou interpretada de forma diferente do que se pretendia ao pronunciá-la, por vezes faz rolar uma pequena bola de neve que termina por se tornar nessa avalanche e que, por vezes, transforma o ser humano no último dos selvagens ou o derradeiro sobrevivente, se assim o desejarem.

Rui Luís Lima

John Curran - "O Segredo dos Kennedy" / "Chappaquiddick"


John Curran
"O Segredo dos Kennedy" / "Chappaquiddick"
(EUA - 2017) - (106 min./Cor)
Jason Clarke, Kate Mara, Ed Helms, Bruce Dern.

Hollywodd tem uma tradição de cinema liberal, um termo bem diferente do significado dado na Europa e este filme assinado por John Curran, não só pertence a esse segmento como se filia também no denominado cinema clássico, ao nos narrar os acontecimentos ocorridos nessa noite de 1969 em Chappaquiddick, num momento em que as atenções do mundo estavam viradas para a Lua e a chegada do Homem à superfície lunar.


Nessa noite Ted Kennedy (Jason Clarke) tinha estado numa festa com amigos e conduzia com a carta caducada, ao seu lado a estratega de campanhas eleitorais Mary Jo Kopechene (Kate Mara) e de súbito uma manobra perigosa à entrada de uma estreita ponte e o veículo mergulha nas águas pouco profundas com os seus ocupantes no interior.


O que se segue irá ficar no segredo dos deuses para sempre, mas o que sabemos é que Mary Jo Kopechene morreu no interior do carro e ted Kennedy conseguiu sair do seu interior não avisando as autoridades, o que irá fazer um dia depois por insistência dos seus mais próximos amigos e conselheiros.


Os Kennedy estão outra vez no "olho do furação da história" e irão ter uma semana repleta de declarações contraditórias, com inúmeros tiros nos pés dados pelo pr´prio senador que aspirava um dia a ser Presidente dos Estados Unidos a América.


"O Segredo dos Kennedy" / "Chappaquiddick" é o que se chama um filme perfeito: realização sóbria e eficiente, excelente ditecção de actores, interpretações a bom nível, com destaque para Bruce Dern a compor a figura do patriarca Joe Kennedy. um argumento muito bem carpinteirado (gosto imenso desta expressão), fotografia e montagem rigorosos. Por aqui respira-se Cinema!

Rui Luís Lima

F. Gary Gray - “O Negociador” / “The Negotiator”


F. Gary Gray
“O Negociador” / “The Negotiator”
(EUA / Alemanha – 1998) – (140 min./Cor)
Kevin Spacey, Samuel L. Jackson, David Morse, J.T.Walsh.

Foi esse cineasta inesquecível chamado Sidney Lumet a abordar a corrupção no interior das forças policiais, optando por um ângulo, até então nunca abordado, nesse filme intitulado “O Príncipe da Cidade” / “Prince of the City”. Já F. Gary Gray consegue, neste “O Negociador” / “The Negotiator”, envolver o espectador em toda a trama, optando por confinar os actores a um espaço, bem reduzido, onde a tensão vai aumentando à medida que o tempo passa, terminando por ter um desenlace surpreendente e com o negociador Chris Sabian (Kevin Spacey) a tentar compreender as razões da teia que rodeia o seu colega sequestrador Danny Roman (Samuel L. Jackson).


De referir que em “O Negociador” temos um conjunto dos melhores actores secundários do cinema norte-americano. Por aqui respira-se Cinema, um cineasta a fixar, como viria a ser comprovado com o seu filme seguinte “Golpe em Itália” / “The Italian Job”, um “remake” do filme protagonizado por Michael Caine em 1969.

Rui Luís Lima

John Crowley - “Circuito Fechado” / “Closed Circuit”


John Crowley
“Circuito Fechado” / “Closed Circuit”
(EUA/Grã-Bretanha – 2013) – (96 min./Cor)
Eric Bana, Rebecca Hall, Jim Broadbent, Julia Stiles.

Um olhar bem crítico sobre o mundo contemporâneo, em que a vigilância não consegue impedir um atentado, mas nada do que aparenta ser corresponde à verdade dos factos e se a justiça pretende apurar a identidade dos culpados, já os serviços de informação têm outras intenções e revelam estar muito acima da lei. Uma película com excelentes interpretações e um sólido argumento, que nos leva a interrogar a informação que nos é oferecida pelos Media.

Rui Luís Lima

Garry Marshall - “O Diário da Princesa” / “The Princess Diaries”


Garry Marshall
“O Diário da Princesa” / “The Princess Diaries”
(EUA – 2001) – (111 min./Cor)
Julie Andrews, Anne Hathaway, Hector Elizondo.

Garry Marshall dedicou grande parte da sua vida a escrever argumentos para séries de televisão, onde a comédia dava cartas, tal como o romance e será com a película “Pretty Woman” que muitos lhe irão fixar o nome como realizador, mas também como cineasta pois ele irá deixar sempre a sua marca na forma como constrói as suas comédias e ao receber o convite da Disney para realizar este “ The Princess Diaries” / “O Diário da Princesa”, tendo por alvo um segmento especifico do público, Garry Marshall cumpre mais uma vez com o que nos habituou ao longo da sua carreira, tendo esta película sido um dos seus maiores sucessos de bilheteira.

Rui Luís Lima

Carlos Saldanha - “Rio”


Carlos Saldanha
“Rio”
(EUA / Brasil – 2011) – (96 min./Cor)
Vozes: Jesse Eisenberg, Anne Hathaway, George Lopez.

Depois do surpreendente e divertido "A Idade do Gelo" / "Ice Age", Carlos Saldanha oferece-nos em "Rio" um maravilhoso filme de animação, que nos irá contar a estranha aventura de "Blu", que vivia tranquilo no Minnesota e que o "destino" levou até ao Rio de Janeiro em pleno período do Carnaval.

A magia da animação passa por aqui!

Rui Luís Lima

segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023

Rob Reiner - “Nunca é Tarde Demais” / “The Bucket List”


Rob Reiner
“Nunca é Tarde Demais” / “The Bucket List”
(EUA - 2007) – (97 min. / Cor)
Jack Nicholson, Morgan Freeman, Sean Hayes.

Tenho que confessar que Jack Nicholson é um daqueles actores que me levam ao cinema e, apesar de nos dias de hoje se falar bastante nos seus tiques, desde que ele ganhou mais um Óscar com o maravilhoso “Melhor é Impossível” / “As Good As It Gets”, continuo a admirar as suas prestações nessa Arte difícil de ser actor. Porque nem só de comédias vive o Jack e basta recordar três títulos, mais ou menos recentes, das suas prestações para lhe reconhecermos o valor: “The Departed” (esquecido nos Oscars); o fabuloso “About Schmidt”; “The Pledge” / “A Promessa” um extraordinário filme realizado por Sean Penn.


E falamos apenas de filmes mais recentes, porque se olharmos para trás temos películas como o extraordinário “Voando Sobre um Ninho de Cucos”, “Shining”, “The Last Detail” ou “Missouri Breaks”, já para não falarmos nesses tempos em que ele vivia de mãos dadas com o cinema independente, isto é “Easy Rider” ou “The Little Shop of Horrors”, no início de carreira. Poderíamos ficar a falar de muitos mais filmes, mas o que nos interessa aqui é, na verdade, “Nunca é Tarde Demais”, a película de Rob Reiner. E por falar do cineasta, que também é actor, recordamos apenas três títulos de que gostamos da sua filmografia “The American President”, “When Harry Met Sally” e o maravilhoso “Stand By Me”.


Isto tudo para nos situarmos um pouco em “The Bucket List”, que apenas pretende ser uma comédia, simplesmente uma comédia, não negra como alguns desejavam, mas uma comédia simples com dois grandes actores: Jack Nicholson e Morgan Freeman.


Edward Core (Jack Nicholson) é um milionário que dirige diversos hospitais (os famosos privados) e que um dia, por razões de saúde, vai conhecer as próprias instalações que gere, não concordando de imediato com a não existência de quartos privados, sendo obrigado a compartilhar o espaço com um mecânico, Carter Chambers (Morgan Freeman) de seu nome, que se encontra hospitalizado para mais um tratamento de quimioterapia.


O mundo destes dois homens é precisamente o oposto e quando o diagnóstico de Edward Core (Jack Nicholson) se revela terrível, compartilhando a mesma doença com o seu colega de quarto, sente o mundo cair-lhe em cima, não conseguindo esconder a sua revolta, perante um pacífico Carter (Morgan Freeman), que aceita a verdade dos factos: pouco tempo lhe resta neste mundo por vezes tão cruel.


Por essa mesma razão, Carter decide seguir o conselho do seu antigo professor de filosofia e começa a elaborar uma lista de coisas que desejava fazer um dia e que nunca teve oportunidade. Edward primeiro acha a lista estranha e depois sem sentido, ao ver os pequenos desejos de Cárter e decide também elaborar a sua, muito mais atractiva que a do seu colega segundo a sua opinião, porque ele possui os meios financeiros necessários para a realizar.


Ao saírem da clínica, combinam juntar as duas listas e partir rumo à aventura, no sentido de usufruírem o melhor possível os dias que lhes restam de vida. Iremos assim assistir às diversas peripécias desse roteiro criado a duas mãos, onde de imediato a comédia se instala, ao mesmo tempo que um olhar sobre o passado origina uma certa reflexão sobre os erros cometidos.


Rob Reiner, durante a estadia dos protagonistas no hospital, oferece-nos um olhar que não esconde a dureza dos tratamentos de quimioterapia, tão bem conhecidos de todos nós, introduzindo depois o seu saber da comédia ao longo da película, pontuado por pequenos momentos de reflexão sobre o sentido da vida, sendo a reconciliação com os familiares mais próximos o derradeiro passo de uma existência: Carter com a esposa que não compreende a sua partida com um desconhecido; Edward que decide visitar a filha e a neta à longo tempo esquecidas.


“Nunca é Tarde Demais” revela-se uma comédia que nos faz pensar um pouco na fragilidade da nossa existência porque, quando deixamos de viver, não partimos para uma nova vida, essa crença que nos serve de bengala ao longo da nossa passagem pela terra e nos leva sempre a acreditar na existência de um mundo melhor. Depois de partirmos apenas ficam as cinzas da nossa passagem, essas mesmas cinzas que o fiel assistente de Edward irá depositar num local perdido de todos os olhares, último desejo de Edward e Carter. Por tudo isto “The Bucket List” merece uma visita.

Rui Luís Lima

Jay Roach - "Uns Compadres do Pior" / "Meet the Fockers"


Jay Roach
"Uns Compadres do Pior" / "Meet the Fockers"
(EUA - 2004) - (115 min. / Cor)
Robert de Niro, Ben Stiller, Barbra Streisand, Dustin Hoffman.

Como diziam os anúncios que passavam na rádio, aquando da estreia de “Meet The Parents” / “Um Sogro do Pior”, Greg Focker (Gaylor Focker, seu nome completo), interpretado por Ben Stiller, foi conhecer os pais da sua noiva Pam, os Byrnes, interpretados por Robert de Niro (Jack) e Blythe Danner (Dina). Está na hora dos compadres se conhecerem, visto Greg e Pam pretenderem marcar a data de casamento.


Esta é a ideia base da sequela de “Meet The Parents” / “Um Sogro do Pior”. Se pensávamos não ser possível mais nada de mal acontecer a Greg durante o tempo que está com Jack, tirem daí a ideia. Se em “Meet The Parents” / “Um Sogro do Pior” os gags tinham uma frescura inusitada, neste “Meet The Fockers” consegue-se muito riso, se bem que com gags já vistos.


Com um Dustin Hoffman (Bernie Focker) surpreendente, na figura do pai de Greg, um verdadeiro doméstico e uma Barbara Streisand (Roz Focker) a vestir a pele da mãe de Greg, terapeuta sexual especializada na 3ª idade, igual a ela mesma (sem partir uma unha), fazendo ambos a sua versão de pais extremosos, que mais não fazem do que embaraçar o filho Greg, mais interessado em manter a boa imagem junto do sogro Jack (carinhosamente tratado pelo compadre Bernie por “El Stiffo”/a tábua).


Já me esquecia da contribuição importante para a risota de Little Jack, o neto dos Byrnes, que tendo apenas um ano, está a ser educado pelo seu avô com métodos especiais, métodos esses, muito racionais, que serão atacados pelos Fockers, partidários do muito amor e carinho na educação das crianças.
Não posso esquecer também a participação dos animais de serviço: o gato dos Byrnes (herdado de “Meet The Parents”) e o cão dos Fockers, que se revelam logo ao primeiro contacto como arqui-inimigos.


Claro que os mais famosos deste “Meet The Fockers” / “Uns Compadres do Pior” sempre se destacaram por outros papéis cómicos e se Dustin Hoffman nos presenteou com, entre outros, “Tootsie” / ”Quando Ele Era Ela” ou “The Graduate” / “A Primeira Noite”, já Barbara Streisand ofereceu-nos a inesquecível "Funny Girl" / "Uma Rapariga Endiabrada” ou “The Mirror Has Two Faces” / “As Duas Faces do Espelho”. Mas é Robert de Niro o mais surpreendente de todos. E se pensam que “Analyze This” / “Uma Questão de Nervos”, é a primeira comédia deste magnífico actor, estão enganados.


A razão porque dizemos isto tem a ver com o facto de muitos já se terem esquecido do genial “The King of Comedy” / “O Rei da Comédia”, realizado por Martin Scorcese e com a participação de Jerry Lewis (no papel de Jerry Langford), num registo dramático/sério, nada habitual neste actor. Robert De Niro, enquanto Rupert Pupkin, persegue o seu ídolo Jerry Langford, para conseguir o objectivo de se tornar um grande cómico, acabando a determinada altura por raptar o seu ídolo, de forma a poder substitui-lo no seu número de “stand-up”.


Conta-se que nos intervalos de filmagens, para descomprimir do seu registo dramático, Jerry Lewis entrava num tal ritmo de piadas que o próprio Martin Scorcese tinha ataques de asma devido às gargalhadas.

Muito anos depois, o cineasta afirmou que este filme, embora fosse muito divertido, não era uma comédia, ainda que considere que esta seja uma das melhores interpretações de Robert de Niro.


Aconselhamos também a recordarem “O Rei da Comédia” / “The King of Comedy”, um filme incontornável nesse difícil género que é a comédia, que esteve em vias de não se concretizar devido a uma greve de realizadores, mas que com a persistência do cineasta e dos principais actores conseguiu chegar a bom porto e ver a luz das salas. Aqui ficam dois filmes para se fazer, em casa, uma daquelas sessões duplas que antigamente preenchiam as salas de cinema de bairro.

Paula Nunes Lima

Peter Greenaway - "A Ronda da Noite" / "Nightwatching"


Peter Greenaway
"A Ronda da Noite" / "Nightwatching"
(Canada/França/Alemanha/Polónia/Holanda/Gr-a.Bretanha - 2007) – (134 min. / Cor)
Martin Freeman, Emily Holmes, Eva Brithistle, Jodhi Mai.

Peter Greenaway é um dos mais originais cineastas e autores que navegam no firmamento cinematográfico e, embora os tempos estejam bem diferentes, neste século XXI, ele mantem-se fiel aos princípios propostos desde o início da sua carreira, recorde-se que ele é originário do universo pictórico, sendo portanto a pintura um dos mais importantes elementos do seu cinema.


E quando nos recordamos desse verso do grande poeta que dizia “mudam-se os tempos mudam-se as vontades”, percebemos a razão do cineasta permanecer fiel aos seus princípios. “A Ronda da Noite” / “Nightwatching” é a prova provada (que nos desculpem a redundância) disso mesmo. Aqui Peter Greenaway volta a navegar no interior da pintura, mais concretamente revisitando a vida do célebre pintor holandês Rembrant e um dos seus mais famosos quadros, intitulado “Night Watch” / “A Ronda da Noite”, no qual ele denuncia uma conspiração da célebre Milícia dos Mosqueteiros de Amesterdão, havida nesse ano de 1642, onde todos os participantes tinham uma razão obscura, que será iluminada/retratada pela pintura do génio.


Estamos assim perante uma obra que faz a ponte com um dos seus filmes mais célebres, o inesquecível “O Contrato” / “The Draughtman’s Contract”, que nesses saudosos anos oitenta nos revelou um cineasta. Na época muito se escreveu sobre ele e a sua obra, para depois lentamente cair no esquecimento. Tal como em “O Contrato” / “The Draughtman’s Contract”, em que o pintor contratado contava nos seus quadros como se processou um assassinato sendo mais tarde, também ele, vítima do seu desafio artístico, aqui Rembrant, que na época já não possuía a celebridade dos primeiros tempos e lutava com enormes dificuldades económicas, repare-se a forma como a sua mulher Saskia (Eva Brithistle) o convence a aceitar a encomenda da Milícia, será também ele perseguido pela sua visão ou seja o artista usa a sua Arte para denunciar um crime que tinha ficado impune.


Peter Greenaway, após a ruptura com Michael Nyman (o habitual compositor das suas bandas sonoras, que se tornou famoso através da sua colaboração com o cineasta britânico), voltou a possuir nesta película uma espantosa banda sonora da autoria de Wlodzimierz Pawlik, que constrói ao longo do filme uma partitura omnipresente, utilizando os instrumentos de cordas de uma forma redentora, pontuando o filme como se fosse também ele um pintor.


Por outro lado a fotografia, esse “must” eterno da obra do cineasta, revela-nos Reiner von Brurmmelen, que iniciou a sua colaboração com o cineasta em “8 ½ Women”, seguindo as pisadas desse grande Mestre da fotografia chamado Sacha Vierny, outro dos habituais colaboradores de Peter Greenaway. Reparem como Brurmmelen usa a luz de uma forma maravilhosa e depois há sempre esses “travellings”, que nos fascinam, símbolo mais-que-perfeito da assinatura do cineasta.


Mal surgem as primeiras imagens de “A Ronda da Noite” / “Nightwatching” no écran, verificamos de imediato que estamos perante um filme de Peter Greenaway e, depois, só nos resta mergulhar serenamente na sua Arte e acompanhar a vida do célebre pintor holandês.


Redescobrir esta obra de Peter Greenaway é mergulhar num universo de luz e cor, onde o medo e o amor do artista andam de mãos dadas, em busca da salvação da sua Arte. Descobrir “Nightwatching” / “A Ronda da Noite” representa o mergulho perfeito num cinema que, infelizmente, se tornou cada vez mais invisível para todos nós.


Nota: O filme teve edição em DVD no nosso país e oferece-nos uns excelentes extras, sobre o cineasta, o filme e o célebre pintor.

Rui Luís Lima

Mike Newell - “O Amor nos Temos de Cólera” / “Love in the Time of Cholera”


Mike Newell
“O Amor nos Temos de Cólera” / “Love in the Time of Cholera”
(EUA - 2007) – (139 min. / Cor)
Javier Bardem, Giovanna Mezzogiorno,Benjamin Bratt, John Leguizamo.

Quando o cinema se lança na adaptação das grandes obras literárias corre, muitas vezes, enormes riscos e são poucos os casos em que o sucesso sorri aos responsáveis pela respectiva adaptação, já para não falar nessas obras-primas da literatura impossíveis de se adaptar ao cinema. No entanto, há casos em que todos são vencedores. E temos como excelente exemplo o caso de “Debaixo do Vulcão” / “Under the Volcano”, romance de Malcolm Lowry, que John Huston levou ao grande écran de forma perfeita.


Como todos sabemos “O Amor nos Tempos de Cólera” é um dos mais belos romances da literatura latino-americana, a par dessa obra intitulada “Cem Anos de Solidão”, ambos escritos por Gabriel Garcia Marquez. E ao falarmos deste grande escritor também não nos podemos esquecer desse outro grande escritor que é Mário Vargas Llosa que, em tempos, viu adaptado ao cinema essa obra maravilhosa intitulada “A Tia Júlia e o Escrevedor”. Adaptação essa que foi um profundo desastre, não devido aos excelentes actores do filme, mas sim ao argumentista(s) que decidiu substituir os argentinos por albaneses, quem leu o livro e viu o filme sabe do que falo (receio de um conflito diplomático, por parte dos Estúdios?!).


E se fomos buscar “A Tia Júlia” foi pelas simples razão de adorarmos esta obra com a mesma intensidade de “O Amor nos Tempos de Cólera”.

Ora passar para o grande écran o romance de Gabriel Garcia Marquez revelou-se uma aventura perigosa, embora Mike Newell seja um cineasta de grande saber, para tal basta recordar “Viagem Sentimental” / “Enchanted April” para estarmos cientes do seu valor, mas a forma como foi talhado o argumento acabou por conduzir o amor de Florentino Ariza (Javier Bardem) e Fermina Urbino (Giovanna Mezzogiorno) a um beco sem saída e não a essa avenida do grande romance por que todos esperávamos.


O romance de Gabriel Garcia Marquez conta-nos a paixão de Florentino Ariza por Fermina Daza, paixão essa que irá sobreviver à passagem do tempo, ao longo de cinquenta anos de uma longa espera, porque o pai de Fermina pretende que a filha se case com um bom partido, que será encontrado na figura do Dr. Juvenal Urbino. Desse casamento irão nascer cinco filhos mas Florentino, apesar da passagem dos anos, nunca irá desistir do seu amor, numa época em que a cólera dominava Cartagena e inundava de dor e morte a cidade.


O escritor colombiano oferece-nos um retrato maravilhoso desta história de amor no seu famoso livro. Por esta razão, se não conhece o livro, veja o filme primeiro e depois leia o romance, no final deste percurso irá certamente meditar em como são tortuosos os caminhos dos argumentos cinematográficos nascidos das grandes obras literárias.


Se a primeira parte do filme, abordando o período da juventude do jovem Florentino Ariza, está perfeita, já o período seguinte nos parece demasiado curto, apostando o argumentista em nos ilustrar apenas as diversas aventuras amorosas do protagonista e não em nos oferecer essa paixão que o irá consumir ao longo de uma vida, dedicando a última bobine da película ao encontro final de Florentino e Fermina, após a morte de Juvenal Urbino (Benjamin Bratt).


No final do filme ficamos com a sensação de que os Estúdios tiveram medo de apostar num filme de três horas onde seria possível rever esta obra espantosa de Gabriel Garcia Marquez em todas as suas vertentes e basta (re)ler o romance para vermos as opções do argumentista.


Mais uma vez Javier Bardem não deixa os seus créditos por mãos alheias e a direcção de actores está perfeita, Mike Newell sabe do assunto, já o argumento revelou-se desastroso devido às opções de Ronald Harwood.


Tentar imaginar este filme tendo como realizador John Huston (1) é o exercício cinéfilo que lhe propomos caro leitor.

(1) - Basta recordar a sua última obra, o espantoso “Gente de Dublin”, a adaptação cinematográfica de “The Dead” de James Joyce.

Rui Luís Lima

Robert Redford - “Peões em Jogo” / “Lions for Lambs”


Robert Redford
“Peões em Jogo” / “Lions for Lambs”
(EUA - 2007) – (88 min. / Cor)
Robert Redford, Meryl Streep, Tom Cruise,
Michael Peña, Derek Luke, Peter Berg.

Robert Redford oferece-nos um filme para meditarmos no mundo de hoje. Todos temos consciência de que o mundo mudou desde os atentados do 11 de Setembro de 2001 em New York e, curiosamente, quando todos pensámos que uma época de paz e bonança estaria ao alcance das nossas mãos, após o fim da guerra-fria, acabámos por acordar para um pesadelo ainda maior. Depois das superpotências terem terminado a guerra entre si, feita por terceiros, vamos encontrar um mundo muito mais explosivo do que aquele em que nascemos. Culpa de quem? As respostas são muitas e por vezes diversificadas. E quando vemos um filme como “Syriana”, de Stephen Gaghan, ficamos ainda mais perplexos, porque acabamos por descobrir as origens de tudo, ou melhor aí é levantado a ponta do véu onde se esconde o terrorismo: as motivações e as causas.


Mas o que nos interessa hoje aqui é um filme de Robert Redford, conhecido actor e cineasta, que nunca escondeu a sua filiação liberal, no interior da política norte-americana. “Lions for Lambs” é um termo usado por um militar alemão durante a Primeira Guerra Mundial, como nos explica o professor de Ciência Política Stephen Malley (Robert Redford), que também nos ensina um pouco como os políticos e as chefias militares usam a chamada “carne para canhão”.


Neste filme, que deixa muitos dos espectadores surpreendidos, vamos encontrar um verdadeiro “filme de intervenção”, já que o argumento de Matthew Michael Carnaham aposta em três segmentos: Jasper Irving (Tom Cruise), um poderoso Senador Republicano com pretensões a Candidato à Presidência dos Estados Unidos da América, convida uma jornalista veterana Janine Roth (Meryl Streep), para lhe fazer “revelações sensacionais” sobre a nova estratégia de combate aos Talibans no Afeganistão; enquanto por outro lado o professor Stephen Malley (Robert Redford) conversa com um aluno que pretende abandonar os estudos e no qual ele vê grandes potencialidades, ao mesmo tempo que, em território Afegão, dois ex-alunos seus partem em missão militar nas perigosas montanhas afegãs, seguindo a nova estratégia delineada pela Casa Branca na sua luta contra a guerrilha.


Estamos assim perante três cenários que nos irão acompanhar ao longo do filme, ao mesmo tempo que somos invadidos com pequenos “flashback” das aulas de Ciência Política, para assistirmos às razões que levaram Rodriguez (Michael Peña) e Arian Finch (Derek Luke), os ex-alunos, a alistarem-se nas Forças Armadas e partirem para a Guerra no longínquo Afeganistão.


Ao longo da conversa entre o senador e a jornalista iremos assistir à forma como os políticos americanos têm manipulado os Media, com grande sucesso no início da guerra, aliás é a própria jornalista a recordar o Senador, que o mundo inteiro apoiou as operações militares após o 11 de Setembro, o pior foi que outros interesses se escondiam por detrás das operações: as reservas petrolíferas no Médio-Oriente, como alguns sabem. Vamos assim assistir a um duelo entre ambos, onde a manipulação combate a verdade dos factos e aqui Janine (Meryl Streep), em luta com a sua consciência, acaba por recusar já na redacção da Estação Televisiva a fazer o pretendido pelo Senador Jasper Irving (Tom Cruise).


Por outro lado, Stephen Malley (Robert Redford) tenta descobrir as razões que levaram o aluno a desistir das aulas, porque vê nele muito mais do que uma gota no oceano, aquele aluno está cheio de potencialidades e o futuro poderá sorrir-lhe se continuar a interrogar o mundo em que vive obrigando muitos a pensar, em vez de ser mais um cidadão anónimo de costas viradas para a política.


Já em plenas montanhas afegãs, a célebre operação criada pelo Senador jasper Irving revela-se uma estratégia falhada, porque atacar as bases Talibans em pleno Inverno nas montanhas mostra-se um profundo erro e aqui vamos encontrar os dois ex-alunos de Stephen Malley a lutarem pela sobrevivência, depois de um ter caído do helicóptero ferido e do outro ter saltado em seu auxilio; perdidos e quase abandonados, são cercados pelos guerrilheiros Talibans e se a tecnologia militar os consegue encontrar, o auxílio, quando chega, é tarde demais.


“Peões em Jogo” é um filme profundamente político, em que temos três grandes actores a mostrarem mais uma vez o seu talento, basta reparar na forma como o sorriso simpático de Tom Cruise se vai apagando ao longo da conversa com Meryl Streep, à medida que as suas palavras encontram um muro de interrogações na jornalista, porque ela se recusa a ser um simples peão da sua estratégia. E só uma actriz como Meryl Strep poderia entrar daquela forma no interior da personagem, personificando no seu rosto as dúvidas que lhe assaltam sobre as motivações do Senador. Já Robert Redford está igual a si próprio, oferecendo-nos o retrato perfeito do intelectual a intervir na área que domina, preparando os homens de amanhã, porque nos seus alunos de hoje poderão estar os futuros dirigentes de uma nação e é muito importante para ele que ninguém faça deles simples peões, como se a vida e o mundo fossem decididos num tabuleiro de xadrez.


“Lions for Lambs” é um filme que nos obriga a pensar no mundo em que vivemos, solicitando ao espectador uma atenção e uma disponibilidade para pensar, que é muito rara no cinema norte-americano deste século XXI..

Rui Luís Lima